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Barraginha na propriedade rural

Simples e de baixo custo, tecnologia reserva água da chuva proporcionando áreas umedecidas favorecendo a agricultura e melhores condições para as famílias do meio rural

Produtores familiares estão segurando a água da chuva onde ela cai e começaram a “plantar água” em suas propriedades, elevando a produtividade das lavouras e a sustentabilidade, deixando de lado a ideia de migrar para a zona urbana.

Todos seguindo um caminho iniciado a mais de 20 anos, em Minas Gerais, onde as chamadas barraginhas foram pesquisadas e começaram a ser implantadas em propriedades rurais. Esse modelo de reservatório de água, surgido nas lavouras mineiras, se espalhou pelo país.

Produtores rurais também vêm investindo com sucesso em outras formas de reservação de água da chuva para aproveitar nas lavouras e na criação de animais. Pecuaristas vêm adotando as cisternas que captam a água da chuva no telhado dos aviários e granjas de criação de suínos. Diferentemente dos poços e açudes, as barraginhas e cisternas dispensam a concessão de outorgas.

Franja úmida da barraginha

As nascentes ressurgiram

Onde a falta de água, a seca e a erosão provocada por enxurradas, produtores descobriram as barraginhas. Onde se produzia 30 sacas de milho por hectare, depois das barraginhas, passou-se a produzir 70 sacas por hectare logo no primeiro ano da implantação ano ano seguinte a produtividade passou para 113 sacas. As nascentes de água voltaram e nunca mais foi preciso de carro-pipa.

Muitos estão conseguindo implantar projetos de ILPF, associando a criação de gado com árvores frutíferas e nativas, após a adoção da tecnologia. Antes disso, as enxurradas lavavam a terra, carregavam todo o adubo e nutrientes e causavam muita erosão.

Muitos enfrentavam secas intensas e já pensaram em vender a propriedade e se mudar para a cidade. Construiram as barraginhas e hoje têm frutas de todo tipo no pomar e muita água. A água da chuva não vai mais embora e se infiltra no subsolo da propriedade. Antes, faltava água todos os anos. Agora, as nascentes voltaram com água em abundância. Com a adoção da irrigação dá para fazer as coisas certas e no tempo correto.

Ilustração da ação das barraginhas no lençol freático

Além de abastecer as criações e aposentar o caminhão-pipa, a adoção das barraginhas possibilitou o aparecimento de animais silvestres como antas, capivaras, pacas, quatis, cotias e macacos prego.

A tecnologia

Mas, afinal, o que são as barraginhas e como fazem a reservação de água das chuvas? São bacias abertas na passagem das enxurradas na parte alta das pastagens que seguram a água da chuva. Demandam apenas duas ou três horas de trabalho de máquina para ficarem prontas, impedem a erosão e promovem uma infiltração no solo, guardando água no lençol freático.

Ilustração da dinâmica do sistema em operação
Ilustração da construção em sistema de terraços

Cada vez que a barraginha enche, a água se infiltra na vertical e se espalha lateralmente ao encontrar uma camada de impedimento, formando um lago. Com isso, vai descendo e subirrigando pomares e lavouras. A água caminha por baixo da terra como uma ola imaginária (franja), aquela onda das torcidas de futebol. Em 15 dias, com uma nova chuva, vem outra ola e elas vão se empurrando no sentido dos córregos. O resultado é uma terra irrigada, com capim verde, o surgimento de olhos d’água nas baixadas e mais água nos rios e nascentes.

Destaca-se a simplicidade da instalação, que não precisa de licença. Demanda apenas um mapeamento do local de passagem das enxurradas, um técnico para medir e determinar o tamanho da barraginha e a pá carregadeira para escavar.

Técnico orientando a construção da barraginha
Técnico orientando a construção da barraginha
As dimensões da barraginha
As dimensões da barraginha

O buraco não pode ser feito em área de preservação permanente (APP). O diâmetro da bacia varia de 16 a 30 metros e a profundidade deve ser de 1,5 metro a 1,8 m. As maiores barraginhas têm capacidade de segurar até 400 mil litros de água. A grande vantagem das barraginhas é proteger a água da evaporação.

Na maioria dos projetos, a máquina e o operador são cedidos pela prefeitura do município e o produtor paga apenas o custo do diesel pelas horas de trabalho. Algumas prefeituras arcam também o combustível.

Máquina finalizando uma barraginha

O início de tudo

O primeiro projeto foi implantado no início dos anos 90 no município mineiro de Sete Lagoas/MG, onde fica a sede da Embrapa Milho e Sorgo. O produtor proprietário da área conta que havia comprado a propriedade de 450 hectares com solo degradado e procurou o suporte técnico da Embrapa para plantar milho no local. Ele queria fazer um lago, mas foi apresentado às barraginhas. Gostou do projeto, contratou as máquinas e fez várias barraginhas. Antes, a água da chuva que cai em abundância de outubro a março carreava terra para os rios. Com as barraginhas, a água passou a se infiltrar, aumentou o nível de riachos e rios e fez aparecer minas onde não havia água.

Esse produtor que cria gado de corte e cultiva cana e pastagens, diz que foi aprimorando o sistema hídrico da propriedade, que tem atualmente duas lagoas e três açudes, tudo gerado pelas barraginhas que já somam mais de 200. As barraginhas nas encostas evitam também as enchentes. A fazenda virou uma vitrine do projeto e já foi visitada por vários ministros de agricultura, prefeitos, secretários e produtores rurais.

Sistema de barraginhas

Hoje, além de Minas, a tecnologia já ajuda produtores em outros 14 estados: Espírito Santo, Pará, Maranhão, Piauí, Mato Grosso, Tocantins, Sergipe, Goiás, Bahia, São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Distrito Federal.

O pesquisador Luciano Cordoval, engenheiro agrônomo que iniciou as pesquisas com barraginhas no Brasil, estima um total de 600 mil espalhadas pelo país. O sistema avança mais na agricultura familiar porque cerca de 90% dos produtores têm terras onduladas, inclinadas, onde a enxurrada corre e provoca mais degradação, como nos grotões do Vale do Jequitinhonha, Piauí, Ceará e Bahia.

A expansão do sistema, acelerada na pandemia, se tornou possível graças a cursos e palestras virtuais e presenciais ministradas pelo pesquisador e também ao trabalho dos técnicos agrícolas privados e públicos, a quem ele chama de “clones”, que replicam pelo país a tecnologia aprendida nos cursos.

Luciano Cordoval, engenheiro agrônomo da Embrapa, o precursor das barraginhas
Luciano Cordoval, engenheiro agrônomo da Embrapa, o precursor das barraginhas

Atualmente, está em tramitação na Câmara dos Deputados um projeto que pode tornar os sistema de barraginhas uma política nacional. O autor é o deputado federal Padre João (PT-MG) que já implantou 40 delas na sua propriedade rural.

Assista ao vídeo “Projeto Barraginhas Embrapa: sustentabilidade hídrica”

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