
O MST anunciou ações para lembrar o dia 17, marco dos 29 anos do Massacre de Eldorado do Carajás, em que 21 trabalhadores rurais foram mortos a tiros por policiais militares durante uma marcha no Pará
Marco dos 29 anos do Massacre de Eldorado do Carajás, em que 21 trabalhadores rurais foram mortos a tiros por policiais militares durante uma marcha no Pará em 17 de abril de 1996, quando outros 69 ficaram feridos, foi dado o start para o Abril Vermelho do MST. Desde então, apenas dois policiais, de 155 envolvidos na chacina, foram condenados. O tema do Abril Vermelho em 2025 é “Ocupar para o Brasil alimentar”. Há previsão de ações nos 26 estados e no Distrito Federal, com foco em terras propícias à produção de alimentos. No início do ano, o grupo divulgou carta cobrando o assentamento de 100 mil famílias que, segundo o movimento, estão acampadas pelo país.
As mais recentes ocupações ocorrem um mês após o presidente Lula fazer a primeira visita a um assentamento do movimento no atual mandato. Ele esteve em um assentamento em Campo do Meio (MG) e, ao lado de ministros e da primeira-dama, afirmou que “tem lado” e não “esquece quem são seus amigos”. No último final de semana iniciou-se a série de manifestações, com o intuito de pressionar o governo federal o cumprimento da política de reforma agrária. Seis propriedades foram ocupadas desde o último sábado (5), em Minas Gerais, Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte, todas terras improdutivas.


Cerca de mil famílias ocuparam a fazenda da empresa CopaFruit, localizada nas proximidades do Instituto Federal do Sertão de Pernambuco em Petrolina, PE, uma das três ocupações feitas pelo MST no estado no mesmo final de semana. Trata-se de uma área que tem todas as características para ser colocada à disposição da reforma agrária, pois não cumpre sua função social. A propriedade deixou de pagar os direitos dos trabalhadores, tem várias dívidas em bancos e órgãos públicos como a Codevasf (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba), está com água e energia suspensas e não tem nenhuma produção.
No município de Goiana, também em Pernambuco, no mesmo dia cerca de 800 famílias do MST ocuparam as terras da Usina Santa Teresa, no município de Goiana, em Pernambuco. A Usina era explorada desde a ditadura militar pelo Grupo João Santos, que já foi um dos mais poderosos da região. Na última década, a família latifundiária passou a ter problemas financeiros e hoje acumula dívidas, inclusive trabalhistas. Localizada em uma das regiões que mais concentra conflitos agrários no estado de Pernambuco, a terra faz parte dos ativos que o grupo pretende vender, para dar andamento a um processo de recuperação judicial. A intenção do MST é transformar a terra em uma área voltada para a produção sustentável de alimentos. O movimento já tem dez acampamentos produtivos na região.

da Usina Santa Teresa, no município de Goiana, PE
O objetivo é fazer um grande acampamento e iniciar um processo de negociação. O movimento quer garantir a desapropriação do todo, pois considera que as terras da usina devem estar a serviço da reforma agrária. No ano passado, o Grupo João Santos foi multado por descumprir um acordo para pagamento de dívidas de R$ 10,7 bilhões com a União. Essa é considerada a maior transação tributária da história do Brasil. O valor é referente a débitos por sonegação e dívidas trabalhistas com cerca de 20 mil trabalhadores. Desse total, R$ 270 milhões dizem respeito apenas à dívidas do FGTS. O conglomerado tem mais de 40 empresas. O grupo também já foi condenado pelo assassinato de um trabalhador em uma manifestação grevista na década de 1990 e esteve envolvido em diversos casos de violência e retaliação contra famílias camponesas ao longo dos anos. Para o MST, essa ocupação também é uma maneira de honrar a luta das vítimas da violência, daqueles e daquelas que tombaram na luta em busca da terra prometida e para que a terra tenha sua função social garantida, seguirão ocupando e comprometido em combater a fome no Brasil.
No município de Mossoró, RN, cerca de 200 famílias da brigada Chico Mendes ocuparam a fazenda experimental da Universidade Federal Rural do Semi-Árido (Ufersa), desativada há mais de 3 anos. Outras famílias acampadas na região oeste do estado continuam chegando e, até o momento, existe uma lista com 300 famílias do movimento para serem assentadas nessa área. Trata-se de uma área de aproximadamente 400 hectares, e as famílias da localidade, já tinham apontado essa necessidade de reivindicá-la para criar um assentamento. Foi escolhida porque já é uma área da União, do governo federal, então tem uma facilidade de repassar para as famílias.

do Semi-Árido (Ufersa) ocupada pelo MST em Mossoró, RN

Na Paraíba, o movimento deu início às atividades do Abril Vermelho com a ocupação da Fazenda Carvalho, localizada no município de Solânea. Mais de 50 famílias decidiram ocupar de madrugada uma área completamente abandonada pelos proprietários, sem cumprir nenhum tipo de função social. Para os líderes do movimento no estado, é preciso avançar com a reforma agrária na Paraíba. Com essa última ocupação, são 29 acampamentos no estado que ainda não tiveram a obtenção da terra concluída. Por isso, o movimento tem tem colocado a reforma agrária como central para o desenvolvimento da Paraíba, para avançar na superação da fome, da miséria e da pobreza e produzir alimentos saudáveis.
Além da desapropriação das áreas específicas em cada estado, as ocupações exigem do governo federal a retomada da política de reforma agrária em todo o país em um contexto de alta do preço dos alimentos, 145 mil famílias vivendo em acampamentos no país – 100 mil delas ligadas ao MST – e um recente anúncio do governo Lula que deverá assentar 8% desse montante.
Em Pernambuco, na região do Vale do Rio São Francisco, o MST aponta que 3 mil famílias acampadas aguardam a destinação de terras para a reforma agrária. No último Abril Vermelho o governo se comprometeu em assentar todas elas após a ocupação da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), mas há toda uma dificuldade em garantir que as áreas sejam adquiridas. A reforma agrária foi destruída por Bolsonaro e a retomada do governo Lula não avançou o suficiente para a demanda do movimento.

No estado do Rio Grande do Norte, 5 mil famílias estão acampadas enquanto aguardam a efetivação da reforma agrária nos territórios. O acampamento mais antigo, Cirilo de Oliveira Neto, aguarda há 18 anos pela titulação da terra. O MST aponta morosidade do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) no processo de desapropriação de terras no estado: o último assentamento a ser criado no Rio Grande do Norte foi o Olga Benário, em 2009. Metade das famílias do movimento está acampada na região oeste do estado, onde está localizado o terreno da Ufersa. É uma região com uma cultura de assentamentos bastante produtivos e por isso a necessidade de criar mais assentamentos na região, tendo em vista que existe levantamento de áreas muito maiores onde o Incra pode fazer a destinação para a reforma agrária.
Na Paraíba, são 2 mil famílias acampadas aguardando a destinação de terras, algumas delas há mais de 20 anos debaixo da lona preta, que estão querendo ter seus direitos garantidos. Desde 2018 foram quatro sem terra assassinados no estado na luta pela terra. Existe um conflito latente no estado, e o Incra avança com muita morosidade.

município de Frei Inocêncio, no Vale do Rio Doce – Foto: MST
Em Frei Inocêncio, MG, no Vale do Rio Doce, mais de 600 famílias do MST ocuparam uma área às margens da BR-116. A ação reivindica a desapropriação da Fazenda Rancho Grande para fins de reforma agrária. Minas Gerais carrega marcas profundas da violência no campo. No Vale do Rio Doce, membros do movimento foram brutalmente assassinados por lutarem pela terra. Em Felisburgo, cinco sem terra foram executados por reivindicar o direito de produzir. Até hoje, a área onde ocorreu o massacre segue sem ser destinada à reforma agrária.
É urgente que o governo passe estas terras improdutivas e endividadas para as famílias que vão produzir alimentos para a mesa dos brasileiros. O MST denuncia essa lentidão em avançar na reforma agrária. Ainda existem 100 mil famílias do movimento acampadas em todo o Brasil. A reforma agrária é a alternativa para combater a fome, a alta dos preços e a crise ambiental.

Ocupações de latifúndios, marchas, distribuição de alimentos e protestos em sedes do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) estão previstas em todas as regiões do país. A maior parte das ações acontecerá até o dia 17 de abril, Dia Internacional das Lutas Camponesas e pela Luta pela Reforma Agrária. A ocupação é um ato constitucional. Terras que não cumprem sua função social devem ser destinadas à Reforma Agrária, como determina a Constituição. O Movimento reafirma o compromisso com a construção do bem viver e seguirá produzindo alimentos saudáveis, plantando árvores e promovendo a agroecologia em todas as áreas ocupadas. Para o MST a paz e a segurança alimentar no campo têm nome: reforma agrária.